Uma mulher caminha nua pelo quarto
é lenta como a luz daquela estrela
é tão secreta uma mulher que ao vê-la
nua no quarto pouco se sabe dela
a cor da pele, dos pêlos, o cabelo
o modo de pisar, algumas marcas
a curva arredondada de suas ancas
a parte onde a carne é mais branca
uma mulher é feita de mistérios
tudo se esconde: os sonhos, as axilas,
a vagina
ela envelhece e esconde uma menina
que permanece onde ela está agora
Bruna Lombardi
A expectativa era sobretudo, não de o conhecer pessoalmente, mas da sua reacção ao conhecer-me a mim…
Não por ser um homem, ou desconhecido… mas ele…
Sem perceber muito bem como, a insegurança apoderou-se de mim, a impulsividade, a frontalidade, a prontidão, a segurança, deram lugar ao nervosismo aliado a uma curiosidade enorme por ter aquele olhar… nos meus olhos.
Enquanto tomava um duche apressado, a adrenalina não permitia outra coisa, imaginava frases que deveria proferir, onde não deixava antever o que sentia.
Limpei-me, pus creme, perfume, e treinava sorrisos ao espelho, sorrisos firmes, sedutores, calmos… tudo falso…
Durante a criteriosa escolha da roupa, o que significa que tirei tudo o que considero minimamente aceitável do roupeiro, só pensava que precisava vestir algo de profundamente sedutor, altamente provocante, e que o fizesse olhar para tudo menos o que considero os meus atributos físicos… isso ficaria para depois.
Mas o que seria o ideal?
Jeans, é vestuário do dia-a-dia, aquela ocasião era tudo menos banal, saia tornar-me-ia demasiado formal, um vestido talvez, mas comprido é cerimonioso, um curto ok, mas se for com um decote dos que eu gosto, está tudo dito!
Pode ser o azul, decote comedido, assenta-me bem e sempre me permite levar os meus sapatos altos pretos!
Está decidido!
Cabelos soltos, queria ser fiel ao que sou!
Daí a meia hora estaria a cumprimentá-lo e queria estar muito bem.
É engraçado, já tomei centenas de cafés com pessoas ditas desconhecidas, é uma atitude até certo ponto do quotidiano, neste caso, era tudo menos comum.
Ele não era comum, não era sequer um qualquer desconhecido…
Sem nunca nos termos visto, conhecemo-nos tão bem, partilhamos tanta coisa, algumas banalidades, muitas confidencias… vou vê-lo finalmente… e ele conhecer-me a mim... que arrepio.
Saí de casa apressadamente sem tentar pensar muito bem no que se seguiria, dirigi-me à esplanada, sentei-me, cruzei a perna, pousei a mala…
E aqueles cinco minutos que se seguiram foram os mais longos da minha vida, cheguei a pensar que ele não viria, aliás porque viria, valeria a pena vir de tão longe só pra me ver, ‘conhecer o teu sorriso’.
Veio… sentou-se e simplesmente olhou pra mim, tudo o que eu tinha pensado, todas as frases de ocasião, os sorrisos preparados, falhou tudo.
A sedução deu lugar a simplicidade, naquele encontro tão desejado e temido, caí em mim, fui só eu…
-Olá…
-Piacere …
E sorrimos em simultaneo , como que selando aquele que seria um principio muito promissor...
O sexo é sagrado,
como salgadas são as gotas de suor
que brotam dos meus poros
e encharcam nossas peles.
A noite é meu templo
onde me torno uma deusa enlouquecida
sentindo teus pelos sobre a minha pele.
Neste instante já não sou nada,
somente corpo,
boca,
pele,
pêlos,
línguas,
bocas.
E a vida brota da semente,
dos poucos segundos de êxtase.
Tuas mãos como um brinquedo
passeiam pelo meu corpo.
Não revelam segredos
desvendam apenas o pudor do mundo,
descobrem a febre dos animais.
Então nos tornamos um
ao mesmo tempo em que
a escuridão explode em festa.
A noite amanhece sem versos,
com a música do seu hálito ofegante.
O sol brota de dentro de mim.
Breves segundos.
Por alguns instantes dispo-me do sofrimento.
Eu fui feliz.
Cláudia Marczak
Tínhamos combinado algo de muito especial…
Devo dizer que há muito não me arranjava tão sublimemente, ou pelo menos com essa ansiedade e entusiasmo.
O meu vestido preto de costas desnudadas, as minhas sandálias de salto alto de camurça, o cabelo apanhado com um travessão, e a maquilhagem, o perfume, tudo bem cuidado.
-Vou buscar-te por volta das 21:00! - Pensava eu enquanto passava creme nas pernas.
As 21.00 chegaram e eu ia jurar que demoraram dias a chegar tal era a expectativa do que me esperava… e chegaram as 21:30… e as 22:00.
E um telefonema apressado:
-Querida perdoa-me, não vamos poder sair, surgiu um grande imprevisto, assim que esteja despachado, vou ter à tua cama.
Vais é o caralho – pensei eu – não vou ficar aqui o resto da noite, dentro deste vestido a ver comédias românticas, a chorar baba e ranho e a esperar que tu chegues sabe-se lá quando, pra me dares um beijinho dizeres desculpa e já está… desta vez não!
Se não vens tu, vou sair eu, afinal estou tão especialmente sexy hoje…
Comi qualquer coisa, já que o jantar estava adiado e saí, podia ter ligado a uma amiga, ou a um amigo, ou ter ido ao bar do costume, mas não, fui para bem longe, onde dificilmente alguém me conhecerá, onde a misteriosa mulher possa estar longe de tudo, provavelmente de si, para depois voltar à grande frustração que seria aquela noite.
Passei por um bar que me pareceu bem, calmo, gente bonita, balcão enorme como eu gosto, música ao vivo.
Entrei.
Pedi uma marguerita, sentei-me a balcão e fiquei a ouvir a música de soslaio, agradava-me aquela nova faceta da minha vida, algo de impensável até então!
Nunca me lembro de ter ido a um sítio sequer semelhante aquele, sozinha, e a verdade é que me estava a saber muito bem. Entregue a mim própria…
Aproximou-se uma voz masculina, que me perguntou:
-Sozinha?
-Sim, e pretendo continuar assim.
-Peço perdão, com licença.
E continuei, ali sentada a ver alguns pares a dançar, alguns casais a rirem e namorar, o que me magoava profundamente.
-Desculpe, mas devo insistir, posso convidá-la para dançar?
-Pode, eu é que insisto que pretendo continuar aqui.
-É óbvio que ficou pendurada, ninguém vem tão deslumbrante para um bar, para ficar ao balcão a tomar margueritas, a ouvir música e a roer por dentro.
Por uma vez tive de levantar a cabeça, olhá-lo de frente… quem pensa ele que é, a confrontar-me com a realidade?
E o que vi, foi um homem de meio idade tremendamente charmoso, não consigo apontar-lhe uma característica especifica que me encantasse, mas o todo era fenomenal, um sorriso absolutamente avassalador.
-Sabe que noutras circunstancias, ou já o teria mandado para algum sitio?
-Provavelmente, mas ambos perderíamos com essa rispidez, vá lá a sua noite não tem que ficar estragada, só porque não foi o que pretendia, deixe-me ajudá-la a recuperar…
Levou-me para uma mesa, pediu outra marguerita e ficámos ali durante horas que pareceram escassos minutos, a falar e a rir, e a saborear uma amarga noite, que se revelou maravilhosa, prazerosa.
Trocámos os números de telefone, combinámos uma saída para breve.
Se o voltarei a ver… não sei, mas que a noite foi inesquecível, disso não tenho a mais pequena dúvida.
Cheguei a casa já quase amanhecia, despi-me na sala, como faço sempre, fui directa à casa de banho e quando me ia deitar, reparei que ele já dormia… ahahahaha...